Medo de dirigir atinge cerca de dois milhões de brasileiros

Acompanhamento psicológico pode ser necessário para tratar a fobia

Johnny Torres 6/12/2018Rosilene enfrentou o medo de dirigir por seus filhos
Rosilene enfrentou o medo de dirigir por seus filhos

Segundo dados da Abramet (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego), cerca de dois milhões de brasileiros sofrem de amaxofobia. É o nome que se dá ao medo de dirigir. A fobia se manifesta em diversos níveis e afeta a vida de quem sofre com o problema. Em casos severos, a pessoa não consegue sequer entrar no carro, como foi com a professora de jazz Rosilene de Gasperi Pagliuso. “Sempre tive medo, não conseguia nem entrar no carro. Aos 22 anos resolvi tirar carta, eu sofri acidente de mobilete indo fazer a prova escrita. Fiquei quase 1 ano para recuperar porque eu quebrei a perna. Já tinha medo, depois disso piorou”, conta a professora.

 

O medo pode ser desencadeado por um trauma, como sofrer um acidente. Esse foi o caso da estudante Júlia Santos: “Quando era mais nova, por duas vezes sofri acidentes de carro, e mesmo que em nenhuma das vezes eu tenha me machucado fisicamente, quando andava de carro ficava apreensiva e com medo de todas as situações que me lembravam dos ocorridos”. Ter proximidade a vítimas de acidentes de trânsito também aumenta a fobia, no caso da universitária Nathalia Gonfinete: “Tenho dois casos de acidentes fatais na família, nestes eu não estava. Perdi meu tio e minha avó em acidentes e isso também é algo que sempre me fez refletir sobre dirigir”.

 

Lidar com o medo de dirigir é cotidiano em autoescolas. Muitas pessoas chegam para as aulas práticas já com receio de pegar a direção, como conta a diretora da Auto Escola Rio Preto, Marlúcia Maria Martins. “Cada caso é um caso. Alguns têm medo porque faz tempo que tirou a CNH, outros por acidente. Também há o caso de mulheres que desistem de dirigir porque o marido grita”, afirma Marlúcia. Trabalhar o medo da direção também faz parte do dia a dia dela. “A gente busca conversar para saber qual é o caso e o que está necessitando. A pessoa chega aqui achando que precisa tomar remédio, mas às vezes é questão de passar confiança para o cliente. Para acabar com o medo tem que enfrentar ele, praticando”, finaliza.

 

Enfrentar a fobia pode não ser fácil para todas as pessoas. Rosilene conta que conseguiu vencer o medo apenas depois dos 40 anos, motivada pelo marido e pelos filhos: “Quando eu tinha 42 anos, meu marido comprou um carro pra mim pela segunda vez. Eu fui trabalhando na minha cabeça, não fui a psicólogo nenhum, mas eu vi que a necessidade. Eu tinha que fazer, tinha que dirigir porque meus filhos precisavam de mim, isso me impulsionou bastante”.

 

A psicóloga especialista do trânsito, Andréa Mulati, conta que, além destes fatores, a personalidade do motorista também interfere no medo de dirigir. “Insegurança, frustração, falta de prática, algum trauma, mas principalmente a personalidade é um fator preponderante. Geralmente são indivíduos que não se permitem errar e principalmente atrapalhar o trânsito”, diz.

 

Andréa, que trabalha para ajudar pessoas habilitadas e com medo de dirigir a voltar para o volante, também explica como é feito o acompanhamento psicológico com quem sofre com a fobia: “O tratamento é feito de forma individualizada, com terapia voltada para o trânsito e aulas práticas de carro. O cliente aprende a identificar o ponto cego do veículo, estacionar em vagas de shopping e trânsito em avenidas, rotatórias e rodovias”.

 

Saiba o que você pode fazer para vencer o medo da direção:

 

1. Saia acompanhado. Pegar o carro sozinho quando se tem medo não irá ajudar a enfrentar o problema. Ter alguém ajudando a enfrentar o trânsito torna a experiência menos difícil para quem ainda não tem prática. No entanto, deve ser alguém que tenha paciência para auxiliar, uma pessoa impaciente tornará o hábito de dirigir mais traumático.

 

2. Pratique aos poucos. Querer andar na rodovia logo de cara não vai ajudar a vencer o medo. Comece com pequenos trajetos, como uma volta no quarteirão, tirar e guardar o carro na garagem. Conforme a insegurança diminuir, passe para metas maiores.

 

3. Pratique em lugares tranquilos. Dirigir com o trânsito movimentado pode aumentar a insegurança e ansiedade de quem está começando. Procure pegar o carro em dias mais calmos como um domingo ou em bairros que tenham pouco movimento.

 

4. Concentre-se em si mesmo. Foque no que você está fazendo, não se preocupe com os pensamentos dos outros motoristas. O que importa é trânsito a sua frente, não preste tanta atenção aos veículos de trás.

 

5. Se permita errar. Quando se está começando, é normal cometer erros, como afogar o carro. Quando errar, mantenha a calma e siga praticando. Com a prática, os bons resultados na direção aparecem e os erros se tornam menos comuns.

(Colaborou Breno Maniezo)

Motoristas recorrem a tratamento psicológico

A aposentada Maria Helena Pereira, 61 anos, sempre foi habilitada para dirigir, mas ficou quase duas décadas sem pegar o carro. A ausência no trânsito ocorreu devido à combinação comodismo e medo. A necessidade de ter autonomia, ser mais livre e senhora de seu destino tornou a questão insustentável. Foi necessário mudar a postura. Maria recorreu a um serviço cada vez mais popular em Rio Preto: terapia combinada com aulas de direção.

 

Quem sofreu trauma, tem receio de conduzir veículo ou não se sente seguro é indicado para receber o atendimento, que trabalha de forma integrada problemas da mente e a habilidade automobilística. Começa no consultório e termina na rua.

 

Após 15 aulas, a aposentada voltou a ser motorista de direito, não só no documento. Pega até rodovia. “Foi uma libertação. É muito bom. Até rejuvenesci. Pego o carro e vou para o lugar que quero.” Tudo mudou em razão de um evento específico. O marido foi internado e ela voltou de mototáxi para casa. “Tive que tomar a decisão.”

 

Já com a empresária Daniely Cristina Niza, 25 anos, ocorreu um trauma. Era passageira de um veículo que se acidentou. Ficou dois anos parada. Até fez aulas particulares, mas não adiantou. Recorreu ao serviço que inclui psicologia. É novamente motorista, depois de seis aulas. Até ganhou um possante de presente do marido. “Ele disse que está orgulhoso de mim. Fiquei contente.”

 

Confiante, já dirigiu até na temida BR-153. Mãe de três filhos, tem diversos compromissos para resolver. “Ao conversar com a psicóloga, já fiquei mais confiante. Dirigir faz diferença em minha vida. Não me sentia preparada. Abriu nova perspectiva.” Ela não esconde a alegria com a conquista.

 

Pelo menos três empresas oferecem o serviço em Rio Preto. Juntas atendem, em média, 50 motoristas por mês. A maioria dos clientes é mulher, com idade entre 25 e 45 anos. O custo de um pacote varia de R$ 300 a R$ 800, dependendo da quantidade de aulas práticas e terapia. Para efeito de comparação, a aula convencional em autoescola custa de R$ 25 a R$ 30.

 

“Muitos motoristas tiram carta, mas não estão preparados. A mulher tem uma vida muito produtiva hoje. Trabalha, tem que levar filho à escola e fazer suas atividades. Não pode depender do carro do marido”, afirma a psicóloga especializada no trânsito Andrea Pavin Mulati. A maior parte não passou por trauma. Apenas não sente confiança ou simplesmente não sabe dirigir.

 

A auxiliar de escritório Silvia Martins dos Santos, 56 anos, ficou 24 anos sem conduzir. Ainda está no curso, mas já começou a pegar o carro. Algo impensável até pouco tempo. Após se envolver em um acidente, ficou chateada e parou. “Também tinha medo. Pensava que não era para mim. Chegou uma hora que acabaram as desculpas. Estou quebrando paradigmas.” É uma conquista a cada marcha.

 

Fonte: Diário da Região

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Terapia dentro do veículo: a psicóloga Andrea Pavin Mulati orienta Daniely Cristina Niza